Soluções de telemetria evoluem graças a possibilidade de transmitir dados em alta velocidade, mas o futuro ainda depende de resolver os problemas do passado
A perspectiva de melhora na economia brasileira, percebida de forma lenta em 2019 e também projetada para 2020, trouxe ânimo a uma indústria crucial para a economia: a automobilística. O número de veículos vendidos cresceu 12,1% nos primeiros seis meses de 2019, segundo a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) – o que também estimula empresas a ampliarem e renovarem suas frotas. Nesse cenário, soluções de conectividade para a gestão desses veículos também ganham espaço, principalmente diante de desafios de gestão de frota que incluem desempenho e segurança dos motoristas.
Os números mostram esse crescimento: ao menos 32% dos 368 gestores brasileiros ouvidos em pesquisa do Observatório de Veículos Empresariais (OVE) planejavam aumentar seu plantel de veículos corporativos ainda em 2019. Esses veículos representam em torno de 10% dos 70 milhões que rodam atualmente no País. Servem tanto a pequenos negócios como a grandes companhias, que detém frotas com centenas de carros, vans e caminhões.
“Nos últimos anos aumentou muito a venda direta de carros para pessoas jurídicas. Isso aconteceu na esteira de soluções como o Uber. A inovação vem para facilitar a vida das pessoas, mas, ao mesmo tempo, exige operação qualificada”, destaca Flavio Tavares, líder do Instituto Parar e fundador do evento Welcome Tomorrow no Brasil. A conectividade se torna, então, parte da resposta para tamanha complexidade.
Para Tavares, o maior desafio da gestão de frotas em meio à transformação digital não é necessariamente o rastreamento – ligado à segurança do bem ou da carga –, mas sim a segurança do condutor. A telemetria é um recurso tecnológico que pode ajudar, trazendo indicadores de comportamento.
Há empresas investindo em soluções de telemetria com conectividade no Brasil, e que tem obtidos bons resultados. Mas já há um novo desafio: reduzir o número de mortes de motociclistas, que atingiram níveis alarmantes com a expansão dos aplicativos de entrega – como iFood, Uber Eats e Rappi – sem que exista regulação para esse tipo de trabalho. Nos últimos dez anos, morreram mais de 200 mil motociclistas no País, e 2,5 milhões se tornaram permanentemente inválidos, segundo dados auferidos a partir de sinistros do seguro DPVAT. Uma verdadeira epidemia de Saúde Pública.
Evolução e soluções
Com a conectividade, soluções de telemetria começam a evoluir. Nos Estados Unidos, elas passaram a incorporar recursos de imagem, que identificam o motivo por trás de uma freada brusca ou aumento repentino de velocidade, por exemplo. Uma câmera dentro e fora do veículo, capaz de gravar áudio e vídeo e com recursos de inteligência artificial (IA) embarcados, automatiza e traz mais subsídios ao trabalho do gestor.
“Estamos passando por essa transição agora”, diz Tavares sobre o mercado brasileiro. “Ainda há muitas empresas de rastreadores usando o termo telemetria e entregando mais do mesmo. Outras estão percebendo a importância da telemetria e da integração de plataformas de gestão de combustível, de controle de multas, ERPs, etc.” Mas é um número pequeno de companhias, como admite o especialista, e concentrado entre aquelas que se preocupam mais com segurança – alguns exemplos estão no setor de bebidas e utilities. Elas têm obtido ganhos como carros que depreciam menos, menores gastos com combustível e sinistros de seguro, entre outros.
O objetivo de empresas que adotam plataformas de big data e analytics – e, em casos mais avançados, também IA – é obter insights de negócio por meio dos dados. Mas há também o small data, pondera o especialista, informação mais “óbvia” que não é observada pelos gestores no dia a dia da operação. “Há gestores que não conseguem acompanhar dois indicadores, e as empresas [fornecedoras de soluções] querem oferecer 30”, diz Tavares. “Nos Estados Unidos vi soluções maduras que combinavam conectividade e IA propondo ações para o gestor. No Brasil ainda há o desafio dos dados comuns, não extraordinários.”
Um exemplo é o das locadoras de carro. Um dos principais custos desse tipo de negócio é relativo ao comportamento do motorista: quanto mais agressivo e descuidado, maior a chance de haver danos ao carro e sinistros de seguro. Apesar de essas empresas terem dados sobre multas, elas não propõem ações de segurança, por exemplo. “Às vezes temos grandes aspirações tecnológicas, com robôs e big data, mas ainda há coisas muito básicas para fazer. A tecnologia pode e deve ajudar, mas tem que começar com o básico”, pondera Tavares.
Futuro depende de lições do passado
Flavio Tavares também é fundador e organizador do Welcome Tomorrow, evento sobre futurismo e tecnologia que ocorreu em São Paulo no início de novembro, com participação da 2S. O executivo define o WTW19 como “um misto do futuro com o ontem”, uma vez que o futuro é “aprender a honrar o passado”. Para ele, de nada vale um robô falando no palco se a infraestrutura de internet disponível para a maioria das pessoas ainda é precária.
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